Contato Imediato

o irracional da razão

sexta-feira, 27 de março de 2015

Cinco anos

Durante cinco anos, Clarice esperou por Clóvis. No começo esperou por minutos de atraso, depois as horas passaram, meses, e anos. Cinco anos de espera. Cinco anos desesperados. Amigas de Clarice não sabiam o que fazer, os psicólogos não sabiam o que fazer, e o caso só piorava. Foi quando Clóvis decidiu voltar. A porta continuava aberta. O adoçante era o pior do mercado, mas era o único que lembrava o doce amor partido, o único durante cinco anos. 
Clarice e Clóvis se conheceram na faculdade de arquitetura e, logo, ela arquitetou que deveriam se unir. Os dois fizeram planos, projetos e plantas. A casa era de uma lindeza só. Tudo de mais requintado, bonito de ver. No início de relacionamento, as amigas disseram que se afastaram, não porque quiseram, mas, porque Clarice não as escutava, nem falava. Clarice não tinha olhos, ouvidos, nem boca, para outra pessoa, diferente de Clóvis.
Clarice era a pessoa que mais sabia da vida de Clóvis. Sabia da hora do remédio, hora do ônibus, hora de dormir, hora de ligar, hora de não falar. Segundo Clóvis, ela era a melhor amiga que poderia ter. Mas as confidências da vida dele eram dadas de bandeja para Isabela. E apesar de Clarice ser a melhor amiga, ela nunca soube, que no início da faculdade, ele teve um momento - paixão fatal - com Isabela, que não parecia tão interessada quanto ele desejava. E entre a estabilidade de um quase amor e a aventura de um amor leve, Clóvis fez o de sempre: fugiu.
Enfim, a casa era grande e ficou ainda maior quando Clóvis decidiu ir para Belo Horizonte, algo como desafiar o limite, montanhas, e saltos ao ar livre. A aventura que tanto evitava no amor, buscava na natureza. Mas Clóvis, depois de cinco anos, voltou. Para a felicidade de Clarice, para o acomodamento de Clóvis, para a infelicidade do casal.
Clóvis não voltou por amor, o que o trouxe de volta foi a covardia. Ele não era homem de amores, apesar de alto, barbudo, olhos escuros e rumores pode onde passava. Era um homem de ão, ilusão, acomodação, invenção. Clóvis voltou porque precisava de alguém que dissesse como ele deveria sentir, de que horas deveria tomar o remédio, essas coisas. Coitada de Clarice, nunca foi tratada como devia, também pudera, ela mesma a tratava tão mal... Todos percebiam, alguns gostavam, mas ninguém se importava.
Depois de ter aceitado o que lhe cabia, Isabela fez uma viagem. Na mala levava lembranças e o dinheiro da demissão. Ela gostava de Clóvis, ele sabia disso, porém a coragem nunca foi o forte do rapaz. Mas o tempo é um amigo precioso. Ela o adorou por anos, esqueceu por meses, relembrou por dias e nos segundos finais de esquecimento, esbarrou em Clóvis, na rua da Saudade. O passado só volta quando esquecemos dele. Depois de cinco anos sem se encontrarem, Isabela não o reconheceu. O coração de Clóvis saltava pela boca, enquanto ela saltava a poça d'água. Ele voltou para casa depois de cinco anos, não por amor...

segunda-feira, 23 de março de 2015

Dolores

- Não sei o que fazer, quando olho para ele, tenho a certeza de que é ele. Ele é o cara. Mas tenho medo de voltar a me magoar como aconteceu nos últimos anos. Tenho medo de que ele não goste de mim e que eu volte a sofrer como sempre aconteceu.
- Minha cara, se o sofrimento parece permanente em tua vida, o que te causa tanto medo?
- O do não ser recíproco. O que me incomoda é não saber o que ele sente por mim. Não consigo não pensar nisso, dele não gostar de mim. O que faço para saber se ele me ama?
- Querida Dolores, o conselho que daria é: escuta a tua balança interna, todos temos uma. Alguns chamam de consciência outros de Deus, ou o Deus da consciência. Te escuta e ouve o silêncio. Sobre as certezas, sinto te dizer que, o que sei dela pode não agradar muito. E talvez tua condenação seja a de entender, de uma vez pra sempre, que não podemos medir o gostar alheio. Quem passa por nós não assina contrato, não estabelece tempo e o medidor vive quebrado, só pra gente não ter a certeza das coisas. É um se jogar em piscinas, sem saber se estão cheias ou vazias. É a corrida em direção ao abismo, qual nos jogamos tendo a plena consciência que nada nos aguarda lá embaixo. Acalma teu coração, que não é a primeira vez e nem a última que a dúvida vai reinar. As incertezas só crescem com o tempo, mas isso não deve ser pensado como algo ruim. As certezas não nos fazem andar. A certeza é algo que perde a graça, ainda mais nas relações amorosas. Certeza só temos quando o tempo passa e esclarece o que era turvo. O amor é a prova das lentes de contato que você usa. Dolores, querida, para de causar dores e pôr os dedos na própria ferida. Dá um play em tua vida.

quinta-feira, 19 de março de 2015

Fica

a nuvem
soma
no céu
enquanto
você
some
no chão
não sei
como
ou onde
você
está
e
desaparecer
não
irá
me
ajudar.




se é

Que saúde tem a saudade,
é mais forte do que o amor.
às vezes, o amor acaba
mas a saudade só cresce

quando não se ama mais,
mas ainda se tem saudade
é saudável esperar

não bater na porta
do amado
não dar uma de pobre coitado,
nem se contradizer em quem foi o culpado.

A saudade permanece
quando o amor nos boicota
e vamos deixar de lorota
pois se é amor, nunca acaba.